Jão subiu ao palco do Qualistage, no Rio de Janeiro, nesta sexta-feira (29), para a estreia do show "Especial de Natal". Durante quase duas horas, o cantor se apresentou para uma plateia de 3.500 pessoas - o barulho dos fãs, no entanto, fez parecer um show de estádio.
Diferente da "SUPERTURNÊ" - que, como o nome sugere, tem estrutura de proporções megalomaníacas, o "Especial de Natal" é um espetáculo intimista para retribuir aos fãs fieis as grandes conquistas que Jão acumulou em 2024.
"A gente tá muito feliz de fazer esse show. Vocês me deram muitos presentes esse ano, mais do que eu acho que merecia", declarou Jão no início do show. O próprio cantor parecia ciente da responsabilidade de transformar aquele show "na melhor noite das nossas vidas", como cita a música "A Última Noite". "Eu estava nervoso. Ver vocês de pertinho me deixa nervoso", brincou.
Como cenário, Jão recria uma casa de dois andares e distribui a sua sincronisadíssima banda entre os cômodos. O astro muito parece referenciar casas de filmes natalinos norte-americanos - há quem tenha achado que a grande inspiração seja o clipe de "Lover", da Taylor Swift, mas o contexto do show não deixa dúvidas da influência dos clássicos do cinema estadunidense.
Jão canta deitado na cama do quarto na tentativa de recriar o momento em que compôs "Doce" e reúne os colegas na mesa de uma ceia ao som de "O Triste é Que Eu Te Amo". Canta os grandes hits "Idiota" e "Me Lambe" e ressuscita faixas do lado B como "Tempos de Glória". Ainda presenteia os fãs com covers de Elvis Presley e The Carpenters, artistas dos quais os tietes menores de idade pouco devem ter ouvido falar - e que bom que exista um Jão para apresentá-los. Por fim, faz nevar após o encerramento apoteótico com "Essa Eu Fiz Pro Nosso Amor".
Os frequentadores do Via Parque, shopping na Zona Oeste do Rio de Janeiro que abriga a tradicional casa de shows, se depararam com uma cena um tanto quanto incomum. Crianças e jovens adultos com gorros de Papai Noel, roupas vermelhas e verdes e alguns até se arriscaram a cobrir o corpo de pisca-pisca. O objetivo era atender a um pedido de caprichar no look, feito pelo cantor e por sua equipe.
E não era só uma tentativa de chamar atenção do ídolo. Até mesmo as pessoas que estavam nos setores mais distantes fizeram bonito na produção. Mais importante para eles era adentrar na atmosfera do show e fazer parte do espetáculo.
Jão é dono de vocais potentes e escreve músicas com storytelling de um jeito ainda raro no pop brasileiro, além de ser bonito, o que, historicamente, sempre deu uma forcinha para os popstars masculinos.
Mas muito além disso, o principal diferencial da "Jão fever" é que o cantor conseguiu criar um senso de comunidade com os fãs que até mesmo em shows de estádio o público se sente íntimo. Tudo isso porque João Vitor, apesar de muitíssimo discreto, se expõe de um tanto em suas músicas que faz parecer que ele e o ouvinte são melhores amigos.
A mera existência deste show apresentado no Qualistage já entrega que Jão trabalha para atender e valorizar essa fanbase tão fiel, sem parecer se preocupar em agradar o mercado ou captar novos públicos. E ele nem precisa.
Os números de Jão, por exemplo, dão um forte indício de que ele conquistou um feito raro na atual indústria musical: converteu a maioria esmagadora dos seguidores e ouvintes mensais em plateia para seus shows.
Ele tem "apenas" 2,3 milhões de seguidores, número que se repete em ouvintes mensais no Spotify. Estatísticas baixíssimas em comparação a outros popstars da mesma geração. Mesmo assim, Jão esgotou três noites no Allianz Parque, totalizando 150 mil pessoas. A mero título de comparação, uma demanda que Luísa Sonza, com 31,4 milhões de seguidores e 9 milhões de ouvintes mensais, está longe de ter.
Apesar da estrutura muito criativa e interessante, da qualidade monumental da banda e, claro, da presença cativante de Jão, minha principal memória desse show será a reação dos fãs. Especialmente, do menininho sentado à minha frente. Sua aparência entregava que ele tinha por volta de 10 anos. Ele chorou como quem realizava um sonho, dançou, berrou cada verso e, em nenhum momento, sacou do bolso um celular para gravar. Em um tempo de músicas tão efêmeras e quando tudo precisa ser documentado, é bom saber que ainda existe um popstar que provoque isso nos jovens.
O Purepeople assistiu ao show de Jão a convite da equipe do Qualistage.